Artigo – Programa Bolsa Família: Contribuições para a redução da pobreza e distribuição de rendimentos
Programa Bolsa Família: Contribuições para a redução da pobreza e distribuição de rendimentos[1]
Virgínia Santos Holanda Bezerra[2]
Instituto Superior de Educação Raimundo Sá, Picos, PI
Andrea Alice Rodrigues Silva[3]
Instituto Superior de Educação Raimundo Sá, Picos, PI
Resumo
O Bolsa Família é um programa de bem-estar social desenvolvido pelo governo federal brasileiro desde 2003 como integrante do Fome Zero. Consiste na ajuda financeira às famílias pobres e indigentes do país, com a condição de que estas mantenham seus filhos na escola. O programa visa reduzir a pobreza a curto e em longo prazo através de transferências condicionadas de capital, que por sua vez, visa acabar com a transmissão da miséria de geração a geração. É considerado um dos principais programas de combate à pobreza no mundo. Este artigo apresenta um estudo sobre a importância do programa Bolsa Família para a redução da pobreza e distribuição de renda. Para tanto, envereda-se pelo método da pesquisa bibliográfica relativa ao tema e como última, levantamento de dados sobre a realidade do programa no município de Picos, Piauí.
PALAVRAS-CHAVE: Bolsa Família; redução da pobreza; distribuição de renda.
Introdução
Por estamos inseridos em um país de extensão territorial continental, (8.511.965 km2) entendemos, até porque vivenciamos (direta ou indiretamente) os seus problemas, que também são megas.
Um dos maiores problemas que afligiam os brasileiros, há menos de duas décadas era a questão da miséria, ou seja, da pobreza absoluta. Problema este que inquietou a nação pela vergonha de sua existência, foi notícia anos a fio na mídia internacional e serviu sempre de trava para o país não avançar rumo ao patamar de desenvolvido, visto que sempre serviu de “mancha” para o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do país. E isto inquietou a nação (como disse anteriormente) e suscitou nela o desejo de resolver, ou ao menos tentar resolver esta mazela, a qual atingia muitos de nossos irmãos brasileiros. Eles nem ocupavam espaço na “Pirâmide Social, simplesmente porque estavam abaixo da linha da pobreza”.
O sensível sociólogo Hérbeth de Souza, mesmo abatido e enormemente debilitado pela AIDS, saiu Brasil afora sensibilizando as pessoas por meio de palestras sobre a situação de pobreza do nosso país, e aonde chegava, ele encontrava adesões às suas ideias e ali, com as pessoas convencidas e já imbuídas de seus propósitos, formava “Comitês que tinha como principal meta pensar a sociedade do ponto de vista ético”. Herbeth de Souza, o Betinho, “gritou aos quatro cantos do Brasil que as pessoas precisavam formar uma corrente contra a fome, “porque não temos mais tempo, estamos correndo contra o tempo, contra esta tragédia que se estabeleceu no país”, dizia Betinho”. O Brasil não pode mais aumentar a sua taxa de indigentes. Não falamos mais de pobreza e sim de indigência – o estado extremo da miséria.
Foi, assim, que a então 1ª Dama do país, Srª.Ruth Cardoso, na sua sensibilidade feminina, começou, com seus inúmeros assessores, a desenhar os Programas Sociais e, depois, aplica-los no plano concreto e os resultados foram, paulatinamente, aparecendo Primeiro, criou-se o Bolsa Escola e Bolsa Alimentação, embora os primeiros programas federais tenham sido criados em 1996 – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e Benefício de Prestação Continuada – BPC. Em 2003, o Governo Federal criou o Programa Bolsa Família com o intuito de unificar os diversos programas de transferência de renda, de modo que no ano de 2006, o Bolsa Família já estava sendo , implementado em todos os 5.563 municípios brasileiros e no Distrito Federal, atingindo mais de onze milhões de pobres.
Este projeto partiu da necessidade de ser saber se o Programa “Bolsa Família” estar atingindo, atualmente, o número desejado de famílias; se as pessoas beneficiadas estão sendo monitoradas por órgãos do governo para não desviar os recursos do seu objetivo original; se estes recursos estão resolvendo, momentaneamente, a questão da fome dar condições aos atingidos de procurar meios de sobrevivência a fim de não depender, sempre, de doações do governo.
Com o advento do Bolsa Família, mais de 11.000.000 (onze milhões) de famílias carentes brasileiras aumentaram o seu poder de compra, melhoraram suas vidas, saíram daquela condição indigna de “pedir esmolas nas ruas, portas”, para receber aqueles pequenos e tentarem administrar através da criação de comitês, já mencionados anteriormente, onde voluntários trabalhavam e levavam socorro até as camadas mais necessitadas.
Perceber a pobreza como fenômeno estrutural decorrente da dinâmica histórica no desenvolvimento do capitalismo, enquanto fenômeno complexo, multidimensional e relativo, permite desconsiderar seu entendimento como decorrente apenas da insuficiência de renda e os pobres como apenas um grupo homogêneo com fronteiras bem delimitadas. Permite também desvelar os valores e concepções inspiradoras das políticas de intervenção nas situações de pobreza e suas possibilidades e impossibilidades para sua redução, superação ou apenas regulação.
Além do exposto, o estudo se justifica também por que os Programas de Transferência de Renda passam a ser considerados importantes mecanismos para o enfrentamento da pobreza e como possibilidade de dinamização da economia, principalmente em pequenos municípios encontrados em todo o Brasil, tendo em vista que, num ambiente econômico em que prevalece o capitalismo, a intervenção governamental através de políticas redistributivas de renda se faz necessária para garantir o essencial à sobrevivência humana e promover a integração social, reestruturando os estratos da sociedade.
1 Políticas sociais no Brasil
Entende-se por Políticas Sociais a intervenção do Estado nas questões sociais existentes, para compensar as distorções decorrentes do processo de desenvolvimento capitalista, que discrimina e faz com que a distância entre ricos e pobres seja cada vez maior. As famílias na sociedade capitalista não dispõem de igualdade de condições sendo que os mais pobres tendem a reproduzir continuamente o ciclo da pobreza: baixo nível educacional, má alimentação e saúde, instabilidade no emprego e baixa renda.
Ao desencadear políticas sociais, o Estado procura diminuir essas distâncias e entre pobres e ricos, diminuindo a distância entre esses dois grupos e permitindo que as novas gerações quebrem o ciclo da pobreza e possam lutar para avançar, no sentido vertical, na pirâmide social.
Educação, Saúde e Trabalho são direitos universais garantidos pela Declaração Internacional dos Direitos do Homem e pela constituição de diversos países. Entretanto, muito mais do que garantir direitos, a atuação do Estado nesses campos garante, teoricamente, a igual oportunidade de ação dos indivíduos na sociedade. Mais recentemente, em 1993, o direito à alimentação foi equiparado aos demais direitos do homem estabelecidos na Carta dos Direitos Humanos de 1948.
Essa mudança fundamental na forma de encarar o acesso à alimentação coloca. Estado na posição de provedor de um direito ao cidadão. Portanto, muito mais que o atendimento ao indivíduo, o Estado estaria cumprindo uma função constitucional a ele atribuída: garantir a segurança alimentar de sua população.
Com o programa “Bolsa Família”, o governo assegurou, ao menos, a retirada das pessoas das e das portas das casas, com uma mão estirada suplificando um de pão; um litro de feijão, de milho ou de arroz. Isto, nem de longe, pode ser aceito como a solução absoluta da fome no Brasil; nem o Estado assegura a alimentação à população prevista na Constituição com este programa. Ele foi e continua sendo uma solução paliativa.
Este programa teve a propriedade, de mata a fome vergonhosa que assolava nosso país, pois assegurou a compra do alimento mínimo no dia dos brasileiros mais carentes. Educação, saúde e moradia são direitos sociais que devem se disponibilizar para todos. No caso do Brasil, todos os municípios possuem escola para educação infantil e fundamental, que garante a alfabetização das crianças, jovens e adultos.
Em relação à saúde, existem hospitais e postos distribuídos em cada cidade para atender a população. Mas, não se pode esquecer que o Brasil é um país subdesenvolvido, onde as carências são enormes e o Estado não tem condições de atender a todos os direitos básicos ao mesmo tempo.
Utilizando-se dos pontos básicos destacados, no caso da saúde e da educação, segundo Grossi (2001) “a renda das famílias aparece como uma variável de seleção fazendo com que os mais pobres nem mesmo procurem fazer valer os seus direitos”. E que diante destas circunstâncias, a população de renda superior, utiliza serviços que são diferenciados, oferecidos nos setores privados com boa qualidade e restando para os demais, que vivem as margens da sociedade, a educação e a saúde oferecida pelo o Governo.
Conforme ainda Grossi (2001, p. 9), diante deste quadro social é que:
[…] Para o caso da alimentação, essa fórmula de seleção tende a se repetire resta ao poder público atender às famílias com maior carência alimentar de forma prioritária e compensatória. A pobreza está espalhada por toda a sociedade em países do terceiro mundo e quando se analisa a possibilidade de dar garantias ao acesso à alimentação com recursos escassos normalmente não se observa nenhuma outra possibilidade a não ser organizar a fila do atendimento atendendo prioritariamente aos mais pobres.
Admitindo-se que o Estado brasileiro tem condições de identificar os indivíduos que se encontram nesta fila, seria possível acabar totalmente com a pobreza ao custo de R$ 29 bilhões por ano (GROSSI 2001, p.9). Simplificando: a idéia de que procurando “organizar a fila do atendimento” funcionaria através de uma maior eficiência e menor desperdício de recursos.
É importante analisar que as políticas sociais são voltadas para um público em situação mais critica, onde a idéia de focalização abrange os direitos sociais e assume que os recursos não são suficientes para atender a todos. Trata-se de uma política com elevado custo para o Estado, principalmente porque se fala em transferir recursos, como é proposto nos programas de transferências de renda mínima. Se tratando do caso brasileiro, este custo é bem elevado, pois a parcela maior da população que é considerada pobre é a que recebe assistência destes programas.
Para Cohn (1995), deve-se entender que as políticas sociais que são voltadas para o alívio da pobreza, são aquelas que têm ação e resultado de imediato, direcionadas a classe mais necessitada, buscando a superação da pobreza, e possibilitando um crescimento sustentável destes indivíduos. Cohn (1995) sugere que as políticas sociais devem buscar:
A articulação entre aquelas (ações) de curto prazo, de caráter mais imediatis, focalizada naqueles grupos identificados como os mais despossuídos, e aquelas de longo prazo, de caráter permanente, universalizastes, voltadas para a eqüidade do acesso dos cidadãos aos direitos sociais, independentemente do nível de renda e da inserção no mercado de trabalho (COHN, 1995, p. 6).
Em resumo, é muito difícil fazer apenas uma escolha ou eleger apenas um publico beneficiário. As políticas sociais têm por obrigação apresentar um tratamento sem distinção e, mais ainda, devem proporcionar – além de uma porta de entrada – uma oportunidade de saída também para a situação vivida pela classe mais podre.
De acordo com o argumento de Fleury (2003, p. 11), um modelo assistencial: “muitas vezes são medidas estigmatizastes, visto que, para ter acesso a determinados programas, é necessário comprovação da situação de pobreza”. É com base nisso que o autor usou a expressão “cidadania invertida”, já que o indivíduo tem de provar que fracassou no mercado de trabalho para ter acesso à proteção social.
Segundo Pochmann e Amorim (2003), o Mapa da Exclusão Social no Brasil indica que 41,6% das cidades do Brasil apresentam os piores resultados no que se refere à exclusão social, sendo a grande maioria situada nas Regiões Norte e Nordeste.
A ‘selva’ da exclusão mostra-se aí intensa e generalizada, com poucos ‘acampamentos’ de inclusão social, pontuando uma realidade marcada pela pobreza e pela fome, que atinge famílias extensas, jovens, população pouco instruída e sem experiências assalariada formal (POCHMANN; AMORIM, 2003, p. 25).
Ainda nesse campo, dados do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da Fundação Getúlio Vargas, utilizando-se do Censo Demográfico de 2000, calcula que 35% da população brasileira vivem em extrema pobreza, equivalendo 57,7 milhões de pessoas, sendo as Regiões Norte e Nordeste as de maior concentração da pobreza extrema, abrigando 13,8 milhões de pessoas nessa situação (INSTITUTO BRASILEIRO DE ECONOMIA – FGV, 2001).
2 O histórico sobre as políticas sociais no Brasil
As políticas sociais no Brasil tem como proposta em discutir o trabalho pelo Serviço Social brasileiro, que são as políticas sociais. E tem como base de analisar as políticas sociais, bem como suas características, organização e gestão no desenvolvimento do capitalismo e das lutas profissionais e sociais.
E no Brasil estão relacionados diretamente às condições vivenciadas pelo País em níveis econômicos, político e social. São vistas como mecanismo de manutenção da força de trabalho, em alguns momentos, em outros como conquistas dos trabalhadores, ou com doação das elites dominante, e ainda com instrumento de garantia do aumento da riqueza ou dos direitos do cidadão ( Faleiros, 1991, p.8)
O Serviço Social, como profissão inserida na divisão sociotécnica do trabalho, deve ser entendido a partir das configurações expressas pelas relações de classe estabelecidas pelo modelo societário, o capitalismo.
Dessa forma, o Serviço Social como uma das profissões responsáveis pela mediação entre Estado, burguesia e classe trabalhadora na implantação e implementação das políticas sociais destinadas a enfrentar a “questão social”, que emergiu na primeira metade do século XIX, com o surgimento do pauperismo, na Europa Ocidental (Pastorini, 2007, p.16), é que ganha hoje, novos contornos a partir do complexo cenário formado pelos monopólios e pelo ideário neoliberal.
O estudo das políticas sociais, na área de Serviço Social, vem ampliando sua relevância na medida em que estas têm-se constituído como estratégias fundamentais de enfrentamento das manifestações da questão social na sociedade capitalista atual.
Não se pode precisar um período específico do surgimento das primeiras identificações chamadas políticas sociais, visto que, como processo social, elas se originam na confluência dos movimentos de ascensão do capitalismo como a Revolução Industrial, das lutas de classe e do desenvolvimento da intervenção estatal. Sua origem relaciona-se aos movimentos de massa socialmente democratas e à formação dos estados-nação na Europa Ocidental do final do século XIX, porém sua generalização situa-se na transição do capitalismo concorrencial1 para o capitalismo monopolista.
Historicamente, o estudo das políticas sociais deve ser marcado pela necessidade de pensar as políticas sociais como “concessões ou conquistas”, na perspectiva marxista (Pastorini, 1997, p.85), a partir de uma ótica da totalidade. Dessa forma, as políticas sociais são entendidas como fruto da dinâmica social, da inter-relação entre os diversos atores, em seus diferentes espaços e a partir dos diversos interesses e relações de força. Surgem como “[…] instrumentos de legitimação e consolidação hegemônica que, contraditoriamente, são permeadas por conquistas da classe trabalhadora” (Montaño, 2007, p.39).
Segundo Vieira E. (1995, p.15), a acumulação é o “[…] sentido de concentração e de transferência da propriedade dos títulos representativos de riqueza”. As transformações ocorridas nas revoluções industriais acarretaram uma sociedade com um vasto exército de proletários.
A política social surge no capitalismo com as mobilizações operárias e a partir do século XIX com o surgimento desses movimentos populares, é que ela é compreendida como estratégia governamental.
A expressão “política social” teve origem entre pensadores alemães de meados do século XIX que criaram, em 1873, uma associação para seu estudo. A partir daí, a expressão passou a ser amplamente utilizada, muitas vezes sem uma clareza conceitual.
Para Vieira E. (1992, p.81), a história do capitalismo testemunha contradição fundamental, de um lado, ininterrupto crescimento do mercado e do consumo e de outro, sua gradativa monopolização.
Dessa forma, pode-se afirmar que não há política social desligada das lutas sociais. De modo geral, o Estado assume algumas das reivindicações populares, ao ongo de sua existência histórica. Os direitos sociais dizem respeito inicialmente à consagração jurídica de reivindicações dos trabalhadores. Certamente, não se estende a todas as reivindicações, mas na aceitação do que é conveniente ao grupo dirigente do momento (Vieira, E, 1992, p.23).
E com Faleiros (1991, p.8), pode-se afirmar que:
As políticas sociais ora são vistas como mecanismos de manutenção da força de trabalho, ora como conquista dos trabalhadores, ora como arranjos do bloco no poder ou bloco governante, ora como doação das elites dominantes, ora como instrumento de garantia do aumento da riqueza ou dos direitos do cidadão.
Segundo Behring&Boschetti (idem, p.64), a generalização dos direitos políticos é resultado da luta da classe trabalhadora e, se não conseguiu instituir uma nova ordem social, contribuiu significativamente para ampliar os direitos sociais, para tencionar, questionar e mudar o papel do Estado no âmbito do capitalismo a partir do final do século XIX e início do século XX.
Ainda segundo as autoras, o surgimento das políticas sociais foi gradativo e diferenciado entre os países, com base nos movimentos e organizações reivindicatórias da classe trabalhadora e na correlação de forças no âmbito do Estado.
3 O histórico sobre políticas sociais no Piauí e em Picos
O Estado do Piauí possui uma inserção recente da política social se compara a articulação entre teoria e prática e o compromisso com a realidade. Através da iniciativa dos pesquisadores Manoel Domingos e Geraldo Almeida Borges foi implantado em 1979, na Fundação Cepro, um Núcleo de História Oral que “tinha a pretensão de produzir deliberadamente documentos de história oral que permitissem recuperar aquilo que não tivesse sido encontrado em documentos de outra natureza” (NASCIMENTO; VAINFAS, 2006: 121).
Dentre os estudiosos que desenvolveram na época um significativo trabalho no NHO-CEPRO, podemos destacar os historiadores Francisco Alcides do Nascimento, DaltonMelo Macambira, Paulo Gutemberg de Carvalho, João Kennedy Eugênio, Shara Jane e Merlong Solano Nogueira. Dando prosseguimento a essas políticas públicas, foi criado, no governo de Hugo Napoleão (1984 – 1988), o Projeto Petrônio Portella, o qual seguia as mesmas linhas do Plano Editorial do Estado, ao publicar importantes pesquisas históricas.
A Balaiada no Piauí (1985), de Maria Amélia Freitas Mendes de Oliveira, e Piauí Colonial: população, economia e sociedade (1985), de Luiz R. B. Mott. Devido ao sucesso atingido por esse projeto, foi criado, nesse mesmo período, pelo prefeito Raimundo Wall Ferraz, a Fundação Cultural Monsenhor Chaves (1986), com o objetivo de “preservar, constituir e dar maior visibilidade ás manifestações regionais e/ou locais” (LEAL, 2008: 86). É interessante destacar que tanto o prefeito Wall Ferraz quanto o primeiro superintendente da Fundação Cultural Monsenhor Chaves, Noé Mendes de Oliveira, faziam parte do quadro docente do Departamento de Geografia e História da Universidade Federal do Piauí.
Procurando estimular a produção de artigos que versavam sobre as práticas culturais no Piauí, essa Fundação começou, em 1987, a editar a revista quadrimestral Cadernos de Teresina. Além disso, desenvolveu projetos que objetivavam, mediante seleção de um Conselho Editorial, publicar teses de mestrado e doutorado, como, por exemplo, Os Literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as tiranias do tempo (1994), de Teresinha Queiroz. Também não podemos deixar de mencionar o papel do Concurso Literário Novos Autores – Prêmio Cidade de Teresina, realizado em parceria com a Prefeitura Municipal de Teresina, no qual umas das obras publicadas foi Múltiplas e Singulares: história e memória de estudantes universitárias em Teresina – 1930 / 1970 (2003), de Elizangela Barbosa Cardoso.
Durante esse período de fermentação cultural, a Universidade Federal do Piauí (UFPI) também assume um papel importantíssimo na divulgação da produção de intelectuais (docentes e discentes) ligados às áreas de Ciências Humanas e Letras da referida instituição, ao promover, por exemplo, a editoração, pela gráfica e editora da UFPI, da revista EspaçoTempo, criada em 1991 pelo Departamento de Geografia e História, e dos textos históricos produzidos com o apoio da Associação de Pesquisadores em Ciências Humanas (APECH). Atualmente, em termos de produção historiográfica piauiense, estamos vivendo numa época em que poucos são os intelectuais que se dedicam à tarefa árdua de publicar livros no Piauí.
Centrados na figura do ex-presidente da Academia Piauiense de Letras e atual presidente da FUNDAPI, Raimundo Nonato Monteiro de Santana, esses intelectuais vêm conseguindo, através de convênios com empresas privadas, “editar obras referenciais de nossa história e lançar jovens autores no panorama das letras” (MORAES, 2003: 277). Como exemplo da atuação desses mecenas podemos citar o lançamento da obra A História negada: em busca de novos caminhos (2004), de Jóina Freitas Borges, da coleção Independência (2006/2007)2 , e dos quatro volumes das Pesquisas para a História do Piauí (2007), de Odilon Nunes, que estavam esgotadas.
Como podemos perceber, toda produção historiográfica encontra-se associada a um lugar social, econômico, político e cultural. Desta forma, é “impossível analisar o discurso histórico independentemente da instituição em função da qual ele se organiza silenciosamente” (CERTEAU, 1999: 71). Depois que a idéia de reconstituição da verdade histórica foi ultrapassada, o tempo da desconfiança veio à tona, isto é, a crença de que o lugar ocupado pelo historiador na sociedade influencia sobremaneira sua escrita. Por isso, acreditamos que o estudo do papel e do lugar das instituições político – culturais na produção historiográfica piauiense não servem apenas para explicar os fundamentos da nossa história, mas, principalmente, para conhecer onde a nossa sociedade está inserida, uma sociedade onde “a modernidade é a escritura”.
4 Aspectos históricos do Bolsa Família
Segundo Silva ET AL (2008), o desenvolvimento de Programas de Transferência de Renda insere-se no âmbito da Proteção Social no Brasil a partir de 1995, com a implantação das experiências pioneiras de programas municipais do tipo Renda Mínima Familiar em Campinas, Ribeirão Preto e Santos, em São Paulo, e da experiência do Programa Bolsa Escola de Brasília.
A partir de 1996 começam a ser desenvolvidos programas de abrangência nacional com a implantação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI, e do Benefício de Prestação Continuada – BPC. A partir de 1999, seguem com a criação e desenvolvimento de experiências criadas em vários estados, chegando-se, em 2003, com a proposta de unificação desses programas mediante a criação do Programa Bolsa Família.
O Programa Bolsa Família, criado pela medida provisória no 132, de 20 de Outubro de 2003, transformada na Lei no 10.836, de 09 de janeiro de 2004, e regulamentado pelo Decreto no 5.209, de 17 de setembro de 2004, é o principal programa de transferência de renda do governo federal. Constitui-se num programa estratégico no âmbito do Fome Zero – uma proposta de política de segurança alimentar, orientando-se pelos seguintes objetivos: combater a fome, a pobreza e as desigualdades por meio da transferência de um benefício financeiro associado à garantia do acesso aos direitos sociais básicos – saúde, educação, assistência social e segurança alimentar; promover a inclusão social, contribuindo para a emancipação das famílias beneficiárias, construindo meios e condições para que elas possam sair da situação de vulnerabilidade em que se encontram (BRASIL, 2006).
Segundo Resende (2008), Programa Bolsa Família e um dos pilares que integra o Programa Fome Zero e possui três dimensões essenciais a superação da fome e da pobreza, conforme MDS (2008): 1) promoção do alivio imediato da pobreza, por meio da transferência direta de renda a família; 2) reforço ao exercício de direitos sociais básicos nas áreas de Saúde e Educação, por meio do cumprimento das condicionalidades, o que contribui para que as famílias consigam romper o ciclo da pobreza entre gerações; 3) coordenação de programas complementares, que tem por objetivo o desenvolvimento das famílias, de modo que os beneficiários da Bolsa Família consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza.
A instituição da Bolsa Família decorreu da necessidade de unificação dos programas de transferência de renda no Brasil, conforme diagnóstico sobre os programas sociais em desenvolvimento, elaborado durante a transição do governo Fernando Henrique Cardoso para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Foi elaborado visando minimizar: 1) a ocorrência de sobreposições de programas, definindo objetivos e público alvo; 2) desperdício de recursos por falta de uma coordenação geral e dispersão dos programas em diversos ministérios; 3) falta de planejamento e mobilidade do pessoal executor, 4) alocações orçamentárias insuficientes, com o não atendimento do público alvo conforme os critérios de elegibilidade determinados (BRASIL, 2006).
O governo federal criou o programa Bolsa Família, em 2003, para apoiar as famílias mais pobres e garantir o direito à alimentação. Para isso, há a transferência de uma renda mensal diretamente para as famílias e as mesmas fazem o resgate deste valor através de saque com cartão magnético distribuído pela Caixa Econômica Federal.
A transferência monetária concedida pelo Bolsa Família é associada ao desenvolvimento de outras ações como alfabetização, capacitação profissional, apoio à agricultura familiar, geração de ocupação e renda e micro-crédito. Garante também acesso àquelas famílias que não possuem filhos, como o caso dos quilombolas, indígenas e moradores de rua.
O Bolsa Família procura enfrentar o problema da pobreza em dois momentos. No curto prazo, o programa pretende oferece alívio aos problemas imediatos e urgentes da pobreza, como a fome e a desintegração do ambiente familiar. No longo prazo, o Bolsa Família tem como objetivo o combate à transferência da pobreza, induzindo a melhoria do status educacional e da saúde de seus beneficiários por meio das condicionalidades, promovendo assim melhores oportunidades de qualificação e conseqüente inserção futura no mercado de trabalho.
Resende (2008) considera que, apesar da oferta de serviços públicos existentes no Brasil, geralmente as políticas publicas, em especial as políticas sociais, são acessadas em maior medida e com mais intensidade pelas famílias menos pobres do que pelas famílias pobres ou extremamente pobres. Em grande parte, isso se deve ao histórico do desenho da oferta publica de serviços de saúde, educação e assistência social, com base em um modelo de espera que fornece serviços e benefícios aqueles grupos que os demandam. Esse modelo também pressupõe que aqueles que não demandam esses serviços e benefícios não necessitam deles.
O grupo da população que se encontra em condições de maior pobreza tem tradicionalmente mais dificuldade para acessar os serviços e benefícios sociais de que necessitam. Esse problema ocorre, em parte, devido a dificuldade na acessibilidade da oferta existente e, em parte, a situação de desvinculação dessas famílias das redes sociais existentes (RESENDE, 2008).
Com base nesse diagnostico, conclui-se, então, que seria necessário desenvolver estratégias que, de um lado, facilitassem o acesso das familias mais pobres aos serviços e benefícios disponibilizados para elas pelo Estado, e, de outro, as vinculassem as redes sociais existentes. A estratégia escolhida pelo Bolsa Família foi condicionar a transferência monetária a compromissos sociais que deveriam ser cumpridos pela família e garantidos pelo poder publico no âmbito da saúde e da educação (BRASIL , 2008).
4.1 Os Impactos do Bolsa Família em Picos
Identificaram-se, com a realização da pesquisa de campo, três claros impactos do Programa na condição social das mulheres beneficiárias. O primeiro deles consiste na visibilidade das beneficiárias enquanto consumidoras. O fato de serem portadoras de um cartão e de receberem uma renda mensal fixa é comentado por agentes governamentais e beneficiárias como um grande ganho porque aumentou o poder de compra. Em Belo Horizonte (RODRIGUES, 2006), uma das beneficiárias assim o expressa:
Se eu for falar, aconteceu com certeza, me ajudou muito. Ajudou em construção, ajudou em alimentação, medicação, […] a gente sabe que se precisar pode, porque tem o dia certo de estar recebendo, sabe que é uma quantia que pode estar fazendo alguma coisa. Minha casa estava caindo e com o Bolsa Família eu consegui.
É verdade que o acesso ao mercado e ao consumo, embora restrito, tem dado visibilidade às mulheres que recebem o benefício, sem que, entretanto, isso tenha gerado um movimento significativo de inclusão social. Agora elas são percebidas pelos comerciantes como clientes confiáveis, a quem se pode vender a crédito, mas esses relacionamentos comerciais não têm aumentado o prestígio social das mulheres, até porque as vendas são de baixo valor, nem têm contribuído substantivamente para a quebra do isolamento social descrito antes neste relatório, já que a maior parte das beneficiárias continua a fazer suas compras no âmbito da vizinhança e do bairro.
Visto dessa perspectiva, o impacto do Programa na condição de vida das mulheres tem ocorrido, sem qualquer dúvida e de maneira decisiva, no âmbito da sobrevivência, sem que, contudo, se estenda ao âmbito da firmação concreta da cidadania. As respostas às indagações sobre as mudanças na cidade e na vida das mulheres articulam as idéias de que o Programa é um estímulo à economia local e uma contribuição essencial para a sobrevivência das famílias. O longo depoimento da uma gestora é, nesse sentido, revelador:
A partir do momento que elas ganham algum dinheiro, elas estão sempre comprando, principalmente alimentos, mas não só alimentos: é uma roupa, é um calçado, é um material de escola. Então, eu acho que melhorou demais a economia local, o impacto foi muito positivo pelo dinheiro que circula dentro do município. Eu sei que existe muita crítica de que o governo dando essas bolsas não está ajudando porque está acomodando as pessoas. Pode até ter acontecido de algumas famílias até se terem realmente acomodado por estar recebendo a bolsa, mas eu acho que na grande, grande maioria faz uma diferencia tremenda na vida delas receber ou não esse benefício. A prova 144 maior disso é que quando elas se vêm com a possibilidade de ser bloqueadas chegam de madrugada aqui, fazem plantão, brigam para ser atendidas, querem atualizar o cadastro, morrem de medo e explicam que dependem disso para comer. É pouco? É. Mas não querem perder em hipótese nenhuma. (SUÁREZ, 2006a).
O segundo impacto detectado pelo trabalho de campo refere-se à afirmação da autoridade dessas mulheres no espaço doméstico. Não se pode afirmar que o Programa mudou as relações de gênero tradicionais, algo que de forma alguma poderia ter acontecido no curto tempo transcorrido desde sua implantação. Em São Luís (FOLTRAN, 2006), uma das entrevistadas se refere aos limites da mudança trazida pelo Bolsa Família:
“As mulheres ficaram mais tranqüilas. Porque como o dinheiro é certo, não temos mais medo. A gente sabe que vai ter aquele dinheiro. Mas mudança mesmo na vida das mulheres, não teve.”
Sem prejuízo dessa afirmação, mas relativizando-a, no discurso das beneficiárias existem fortes sinais de que a capacidade de compra das mulheres vem suscitando alterações na hierarquia familiar pelo simples fato de as mulheres poderem, agora, fazer escolhas e, principalmente, negociar sua autoridade no âmbito doméstico.
À indagação de se as mulheres teriam passado a ter mais influência e a serem mais respeitadas pelos membros da família depois de receber o benefício, a maior parte dos depoimentos aponta mudanças muito significativas. Nos municípios mais rurais, a mudança é expressa em termos das mulheres serem mais respeitadas agora, tanto porque não dependem do marido ou companheiro como porque podem contribuir com os gastos da família. Nesses depoimentos (SUÁREZ, 2006a), a capacidade de fazer escolha não é percebida ou não é manifestada:
“Acho que sim porque já não tem que pedir ao marido.” “É mais respeitada, sim. Porque a pessoa, precisando, já não vai pedir mais a ele e levar uma bronca.”
“Tem de ser bem respeitada porque quando falta um negócio já tem ajuda desse dinheiro.” “É sim, porque as mulher, tendo, já compra uma coisinha para um, uma comidinha para outro. Quer dizer que a gente já pode. Antigamente a gente não tinha dinheiro nenhum.”
Considerações Finais
Diante de todos os dados obtidos nessa pesquisa, foi possível perceber as imensas lacunas deixadas na execução do programa, pelas dificuldades do poder local na execução das políticas públicas. Na pesquisa de campo, encontramos algumas barreiras e tivemos que ser perseverantes.Especificamente no reduto escolhido (Picos) algumas pessoas, os responsáveis da residência, apesar de receberem o benefício, se negaram a colaborar sem dar uma explicação palpável demonstrando, assim, não querer expor seus dados ( mesmo impessoais), provavelmente por haver alguma irregularidade naquele benefício, especificamente.
Sabe-se que a política da assistência social é atravessada por uma gama de demandas devido à pobreza e a desigualdade que assolam o país e, principalmente, os municípios mais pobre. A recente criação do Sistema Único da Assistência Social – SUAS – é um avanço no sentido de melhorar o atendimento e o acesso de serviço para a população, mas ainda insuficiente diante da imensa demanda e dos problemas oriundos da política econômica.
Muitos programas sociais são utilizados por políticos, como forma de conquistar o povo para obtenção do voto. Os usuários, por sua vez, possuem épocas de mudança de gestão, em qualquer das instâncias do governo. O mal uso desses recursos dos programas sociais – por políticos – com fins eleitoreiros desvia completamente o sentido e o objetivo primordial do programa, além de se está cometendo um crime eleitoral. Sendo assim, a população fica a mercê dessa situação que acaba por fragilizar as ações, tornando-as descontínuas.
Referências
BRASIL. Medida provisória n. 132 de 20 de outubro de 2003, 2003. Cria a Bolsa Família, 2003.
______; Presidência da República. Lei 10.836 de 9 de janeiro de 2004. Instituem o Programa Bolsa Família, 2004.
______; Presidência da República. Decreto 5.209 de 17 de setembro de 2004. Regulamentam o Programa Bolsa Família, 2004.
______. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME. Manual de Gestão de Condicionalidades. 1. Ed. Brasília – DF. 2006.
______. Guia de Políticas e Programas do Ministério do Desenvolvimento Social eCombate à Fome – MDS. Brasília, DF, 2008.
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FLEURY, Sonia. “A seguridade social” (FGV) 2003
[1] O presente estudo é uma compilação do Trabalho de Conclusão de Curso ‘Programa Bolsa Família: Contribuições para a redução da pobreza e distribuição de rendimentos’, de autoria do escritor deste artigo.
[2] Graduada no Curso de Serviço Social pelo Instituto Superior de Educação Raimundo Sá.
[3] Coordenadora do Curso de Serviço Social do Instituto Superior de Educação Raimundo Sá. Orientadora do presente trabalho.