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Os segredos na bandeja: A história do garçom do gabinete da prefeitura de Picos

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Por Raí Junior 

Quem ver aquele senhor de cabelos brancos e face marcada pelo tempo, nem imagina que ele pode guardar alguns dos maiores segredos da história recente da política picoense. Segredos compartilhados entre poucos. Que fariam colunistas políticos soltarem fogos de artifício ou saírem correndo pelados pela rua gritando “eureca” . José de Matos Filho, ou “Zé Moreno” como é mais conhecido, tem 67 anos de idade, e destes  51 foram dedicados a profissão de garçom, os últimos deles no Palácio Coelho Rodrigues. Se ele resolvesse falar tudo que já ouviu, poderia tirar o sono de muita gente.

Zé Moreno, que garante ser o garçom mais velho exercendo a profissão em Picos, nos recebeu, na sala de reuniões da prefeitura. Muito educado e elegante, vestindo uma calça de linho azul escuro, camisa branca, blazer escuro e gravata-borboleta preta; com voz mansa e olhar tênue começou a contar histórias de sua vida e profissão. A vida profissional como garçom começou aos 16 anos, dois anos depois que deixou a localidade Pitombeira, zona rural de Picos, para vir morar no centro urbano em busca de trabalho para assim poder ajudar os pais na árdua tarefa de criar 10 filhos. Desde então adotou a profissão que cumpre a mais nobre missão de um homem: servir ao próximo.

Zé Moreno: garçom do Gabinete da Prefeitura de Picos./Foto: Raí Junior
Zé Moreno: garçom do Gabinete da Prefeitura de Picos./Foto: Raí Junior

“Eu gosto de servir. Me sinto bem e, tanto faz ser autoridades como uma pessoa comum, uma pessoa humilde. É o meu trabalho e amo o que faço. Se eu não gostasse não estaria servindo as pessoas há 51 anos. Se todo mundo desse valor ao que faz, talvez o mundo fosse melhor, né?”,  disse.

Por ser o primogênito, Zé Moreno tomou para si a responsabilidade de trabalhar e garantir os sustentos para os seus irmãos mais novos estudarem. Hoje se diz orgulhoso pelos irmãos que continuaram a estudar conseguindo sonhos maiores, uma irmã se tornou advogada, outro gerente geral da Caixa Econômica Federal da capital Teresina e um terceiro que trabalha como servidor público no Congresso Nacional. Os demais construíram família e vivem bem.

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Como garçom, Zé Moreno disse ter conseguido levar uma vida de forma agradável, casou-se, gerou filhos e conseguiu colocar todos na faculdade. Foi presidente do extinto Sindicato dos Garçons de Picos; trabalhou duro e conseguiu ser microempresário (bar e restaurante), mas com a grave crise econômica do governo Sarney, em 1987 quando a inflação atingiu o índice alarmante de 366% no acumulado dos 12 meses, Zé Moreno se viu falido e voltou a profissão que gostava de exercer. “Perdi tudo e não recuperei, mas não me fez tanta falta, voltei a trabalhar no que gosto de fazer e graças a Deus consegui criar os filhos. A profissão me deu muita coisa”, declarou.

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A profissão de seu Zé Moreno de fato lhe deu muitas coisas, entre elas o privilégio de saber muitos dos segredos  da política local. Mesmo antes de trabalhar no gabinete da prefeitura, Zé Moreno trabalhou em diversos eventos políticos; já atendeu pelo menos 5 governadores, o ministro da saúde e outras dezenas de senadores,  deputados e autoridades políticas. Sempre teve gosto pela política, chegou a se candidatar a vereador em 2012. Depois que passou a trabalhar como garçom do gabinete da prefeitura de Picos esse contanto com a política se tornou ainda mais frequente.

Durante entrevista admitiu que por muitas vezes entrou no gabinete ou na sala de reuniões e percebeu que o momento era de discussões sérias e ouviu que coisas que não devia ter ouvido. Contudo, deixou claro que jamais falaria quais seriam esses assuntos durante a entrevista. Ressaltando que sua ética profissional não permitia. Tentando puxar mais sobre as supostas conversações sigilosas perguntei se ele já tinha acompanhado algum assunto na imprensa com uma versão diferente do que ouvira no gabinete; ético e tranquilo limitou-se em dizer: “sem comentários”.

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Como participante da rotina do gabinete testemunhou alguns dos acontecimentos importantes recentes da política local, como a renúncia do ex-prefeito Kleber Eulálio. Um dilema bastante discutido na imprensa e nas rodas de conversas se Kleber de fato seria candidato ao cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Naqueles dias muitos acontecimentos, conversações e reuniões antecederam o episódio da renúncia. Para Zé Moreno “foram dias diferentes”. Talvez ele já sabia o que para muitos já era dúvida.

Tento de novo arrancar do entrevistado algo que sobre o que ocorre pelos corredores do Gabinete. Como estar o clima interno depois que o padre Walmir Lima assumiu a prefeitura, seu Zé Moreno? “Estar tranquilo”, diz econômico.

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Na última tentativa de fazê-lo falar alguma coisa pergunto se ele considera saber mais do que um cidadão comum sobre os rumos da nossa política, e dessa vez ele foi poético. “A gente ouve mais não escuta nada”, respondeu.

O fato é que um garçom muitas vezes é ignorado pelas autoridades durante momentos sigilosos, esquecendo que estes como cidadãos também tem interesse em diversas questões políticas, que escutam e percebem o que ocorre ao seu redor.  Nesses 3 anos que passou entrando e saindo do gabinete onde são tomadas as decisões que afetam a vida dos picoenses e agitam a cena política da Capital do Mel, sem dúvidas o senhor simpático e comedido nas palavras, já ouviu e presenciou muita coisa. Que muitos de nós jamais saberemos.

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Mesmo sem conseguir uma só palavra sobre os segredos do garçom do gabinete, fiquei certo de que a pauta tinha fundamento, que seu Zé Moreno ouve ou que eu não poderia ouvir. Obvio! Mas voltei para a redação satisfeito por ter conhecido a história de um homem honesto, um cidadão consciente, mas um profissional apaixonado e ético.

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